A Páscoa tem de base um
único princípio, a liberdade.
A primeira Páscoa,
também conhecida como Páscoa judaica, tem origem na libertação
milagrosa do povo judaico, depois de 400 anos como escravos no Egito.
Este acontecimento está descrito na Bíblia no livro de Êxodo.
Muitos povos já lutaram
pela sua liberdade, mas neste caso, um povo escravo, sem armas e sem
exército foi libertado pelo poder sobrenatural de Deus contra uma
das mais poderosas nações da altura.
Se a Páscoa judaica
significa liberdade através de Deus, Jesus Cristo trouxe novos
princípios à Páscoa.
A Páscoa cristã, não
é a celebração de um acontecimento passado, é um ato contínuo de
liberdade que traz as pessoas da escravatura e do engano para a
liberdade e verdade, tudo proporcionado pela morte e ressurreição
de Jesus Cristo.
Uma parte importante da
libertação dos escravos judeus foram as dez pragas, mas a marcação
das portas com o sangue de cordeiro para evitar a visita do anjo da
morte na última praga, foi o prenúncio da obra sacrificial e
substitutiva de Jesus Cristo na cruz do Calvário.
Este ato substitutivo de
Jesus Cristo trouxe a toda a humanidade aquilo que se chama de
salvação, ou reencontro com Deus, ou o encontrar o equilíbrio e é
tema sobre o qual já escrevi.
Segundo o conceito do
Velho Testamento, a paz com Deus só era efetuada através de
oferendas de cereais ou de animais. Uma parte seria para queimar em
oferta ao Senhor, a outra seria para a alimentação dos sacerdotes.
Dos animais, geralmente cordeiros, a gordura era para queimar, a
carne para a alimentação.
Este ritual foi imposto
por Deus para que o seu povo não tivesse os mesmos hábitos de
sacrifícios de pessoas e crianças aos deuses dos povos. Na Europa a
morte de crianças em rituais religiosos sacrificiais só terminou
com a propagação do cristianismo, que zela pela vida física,
psicológica e espiritual.
Jesus Cristo, Deus,
ofereceu-se para substituir definitivamente as ofertas pelos pecados
e pagou na cruz do Calvário a derradeira sentença, por isso é
chamado o Cordeiro de Deus. Assim, em Jesus Cristo, terminaram as
oferendas e todos aqueles que quiserem, podem-se incluir nesta
maravilhosa aventura de graça e libertação oferecida pelo próprio
Deus, para que se tenha vida.
Através da morte e
ressurreição de Jesus Cristo ganha-se liberdade e vida, mas a
aumenta a responsabilidade. Com Jesus Cristo alterou-se o modo de
pagamento, cada humano já não precisa de pagar, já foi tudo pago,
que tem como consequência a não intervenção com atos materiais
e/ou cerimoniais, pois o perdão passou a ser uma atitude recetiva
e não participativa.
Com esta Nova Aliança,
assinada por Jesus Cristo em nome de todos, os humanos entram na fase
adulta. Com Adão e Eva foi a perda da ingenuidade, com a libertação
do Egito e posterior legislação levítica foi a juventude, foi a
fase em que o pecado tinha um custo, tal como uma punição que
poderia ser substituída por um pagamento, com a Nova Aliança o
preço foi pago definitivamente e a punição foi cumprida. Assim
aumenta a responsabilidade, pois a salvação vem pela fé e é
uma opção. A Nova Aliança com Deus em Jesus Cristo é uma
atitude que tem de dar fruto.
Ao selar na cruz a
Nova Aliança, Jesus Cristo colocou a ênfase da vida em dois
princípios, o perdão e a assunção das responsabilidades em nome
dos outros.
Perdoar
é em primeiro lugar uma atitude recetiva. Não se pode dar o que não
se tem. Só se pode praticar o perdão se já se recebeu o perdão da
cruz. Somos canais de bênção e não acumuladores, somos rios e não
barragens. A mensagem da cruz é esvaziada quando não se põe em
prática, pois o sacrifício na cruz efetuado por Deus foi um
tremendo ato de amor ao perdoar todos os que querem ser perdoados. O
perdão é para todos, mas tem uma condição, só se torna efetivo
para aqueles que o aceitarem e os que o aceitam tornam-se fontes de
perdão. Perdoar é um ato de fé, é uma expressão de confiança.
Não se perdoa para se receber
algo em troca, perdoa-se e pronto.
Um ato de perdão genuíno produz libertação das raízes de
amargura e com todas as consequências positivas no plano espiritual,
noplano psíquico e até no físico. O perdão produz o equilíbrio
na totalidade do ser.
O
perdão é de tal maneira importante que as falsas doutrinas
utilizam-no para manipular as pessoas de boa vontade. Utilizando a
paráfrase de um poeta, pode-se dizer que os
maus são uns fingidores que fingem completamente o perdão, que não
dão, mas que exigem dos outros.
Em
Mateus capítulo 10, Jesus envia os discípulos em missão. Entre as
ordenanças e conselhos, Jesus instruiu-os a serem prudentes e
inofensivos, pois ia enviá-los para o meio de lobos. Este conselho
continua a ser válido, pois os falsos tentam manipular o perdão.
O
cônjuge que manipula o outro para puder fazer o que quer, mas que
não tenciona alterar o seu comportamento.
O
hipócrita que dá um ar de sério e exige perdão mas que não
tenciona mudar.
O
mentiroso que sabe o que está a fazer, mas exige perdão e não
tenciona corrigir a mentira.
Os
manipuladores que fazem tudo para obter o que pretendem.
Os
apoiantes que muitas vezes sabem que estão errados, mas preferem
continuar no erro e ainda exigem recompensa.
Tantos
casos em que as vítimas para continuarem a ser destruídas
psicologicamente, fisicamente e espiritualmente são manipuladas com
o argumento do tens de perdoar.
É
importante realçar que perdoar não é o mesmo que ser auto
destrutivo. Perdoar não sendo uma alternativa, também não
significa que se tenha de continuar a sofrer abusos. Por vezes a
melhor solução é o afastamento, caso seja possível, pois sabe-se
que quer os abusadores ou os seus apoiantes estão sempre prontos a
enganar. A Igreja está repleta de falsos, pois é o sítio perfeito
para os abusadores e seus apoiantes saciarem a sua maldade, seja na
coscuvilhice, seja nas coisas simples do dia-a-dia, na destruição
de famílias, nas falsas doutrinas, no aconselhamento ao adultério
fingindo ser apoiado divinamente, na manipulação de sentimentos, na
extorsão de bens e dinheiro e em tantas outras áreas.
Perdoar
sem condições, sim, mas conviver ou viver com as origens, ou seja,
com os agressores exige prudência e oração.
Jesus
prometeu um consolador que ficaria connosco para sempre (Jo 14:16). O
Espírito da verdade ajuda-nos em situações de desconforto,
agressões ou perseguições, sejam dentro ou fora da igreja e nos
momentos de solidão criados pelos agressores e manipuladores muitas
vezes o Espírito Santo é a única ajuda.
Os
exemplos do perdão devem vir de cima, e Deus não é exceção, Ele
deu o exemplo. Deus deu tudo o que tinha para a reconciliação
perdida no Éden. Jesus Cristo foi acima de tudo um prático, a sua
vida correspondia com os seus ensinamentos. Perdoar foi a Seu ato
final, e para isso foi crucificado
A
Páscoa é a reconciliação definitiva com Deus, preparada e
consumada por Aquele que foi ofendido, desconsiderado e ultrajado.
A
crucificação foi o pagamento definitivo do pecado, que é o que nos
separava de Deus.
O
perdão não é uma ato emocional é uma ordenança
que foi implementada na prática pelo próprio ordenador e não é
uma alternativa, é uma consequência prática e real praticada por
Deus e é o expoente máximo do amor.
O
perdão não sendo um ato emocional é uma atitude definitiva, não é
algo hoje, mas amanhã por qualquer motivo volta a agitar a alma.
O
perdão real produz não apenas libertação de ambas as partes mas
também produz cura, cura da alma com a libertação do peso da
ofensa.
Mas
a ênfase da Páscoa não foi apenas no perdão, foi também na
assunção de responsabilidades em nome de outros.
Jesus
Cristo assumiu uma dívida em incumprimento, dívida originária no
Éden e que passava de geração em geração. Esta assunção de
responsabilidade diante de Deus, em nome de toda a humanidade não
foi uma atitude emocional, foi um ato deliberado e consciente.
O
perdão deve ser uma prática de cada cristão, assim como o exemplo
de Jesus Cristo de assumir a responsabilidade dos atos de outros,
deve também fazer parte da prática cristã.
Hoje
consideramos a morte e ressurreição de Jesus Cristo como uma
vitória, que nos coloca por cabeça pelo conhecimento de Jesus
Cristo, alterando assim a perceção do universo. Na altura não foi
assim, a condenação foi considerada pelos senhores do templo como
uma derrota para Jesus, pois pensavam que tinham derrotado e
humilhado publicamente o seu adversário.
Não
somos diferentes de Jesus Cristo, o facto de perdoarmos e de assumir
culpas dos outros vai trazer humilhação, mas paradoxalmente a
libertação que produz é incomensuravelmente superior aos danos.
Eventualmente pode-se ficar mal visto e incompreendido pelos outros,
mas a alma fica liberta da responsabilidade e do peso do pecado nem
que seja o dos outros.
Deus
desafia os seguidores de Jesus a serem seus imitadores. A morte
substitutiva de Jesus Cristo vem colocar-nos um desafio:
Estaremos
dispostos a assumir a culpa de algo que foi feito contra nós?
Vejamos,
Jesus foi insultado, cuspido, chicoteado, humilhado e crucificado,
estando inocente. Aceitou e fez tudo, para cumprir a sentença do
nosso pecado contra Deus que também é Ele.
Como
consequência de tudo isto, do sofrimento do inocente, hoje somos
livres e essa liberdade produz efeitos mesmo quando somos
incompreendidos e humilhados.
Vivemos
num mundo onde impera a arrogância, a agressividade, a mentira, a
malícia, o interesse do eu, a intolerância, a maldade, um mundo
onde tudo isto é praticado e tolerado hipocritamente. Vivemos num
mundo onde a Igreja está cheia de joio pronto a desviar os incautos.
É
neste mundo e com pessoas que praticam tudo isto e até coisas piores
que temos de viver.
Foi
para libertar as pessoas desse mal interior que Jesus Cristo foi à
cruz, como pagamento por toda a maldade, por toda a minha e por toda
a tua maldade.
Ninguém
é bom nem bonzinho, mas através
do Espírito Deus seremos pessoas em renovação não apenas no
caráter mas também renovados em coragem para perdoar e assumir a
culpa de outros do mal feito contra nós.
A
consequência prática do ato de reconhecer e aceitar a Jesus Cristo
é a libertação da amargura da injustiça, pois assumimos a culpa
da injustiça, do mal ou seja do que for e assim Deus já pode
libertar esse mal e consequentemente deixará de ter efeito,
poderemos então dizer que a alma foi curada. A vida é uma
continuidade e os atos de perdão e assumir as culpas serão também
uma constante.
Parece
um paradoxo que a vítima assuma a culpa para ser libertada do mal
que lhe fizeram, mas tudo
isto é uma realidade num mundo real mas com consequências
espirituais. Temos de compreender que qualquer que seja o pecado
contra nós tem de ser liberado. Não chega o perdão mas tem de
haver libertação e se o ofensor/agressor não tiver capacidade ou
discernimento para tal, temos como cristãos de assumir perante Deus
as responsabilidades para que o mal seja perdoado. Ao
assumir a culpa tornamo-nos pecadores, mas sabemos que temos diante
de Deus um advogado (1Jo 2:1) que intercede por nós, para que
sejamos liberados. É a certeza da salvação e do perdão que nos
permite tomar decisões que parecem loucura para os homens, mas que
liberta os cristãos para plenitude da comunhão com Deus.
Uma
das consequências práticas da não libertação do pecado é uma
das mais populares doenças da atualidade, a depressão, não em
todos os casos, mas em muitos têm a ver com raízes de amargura, de
falta de perdão e de libertação da agressão de que se foi vítima.
A
vida não é linear e nem tudo tem de se fazer da mesma maneira. O
legalismo é inimigo da sabedoria. As regras são opressoras, os
princípios libertadores. Se devemos ser praticantes do perdão e da
libertação do pecado contra nós, também devemos ser sábios na
aplicação do relacionamento futuro com os agressores, pois muitos
deles não vão perceber absolutamente nada e vão continuar na deles
e por vezes até piorar a situação, mas a nossa relação com Deus
não pode ser prejudicada por causa de outros.
A
Páscoa cristã não é uma festa anual de celebração, é uma
atitude diária de vida, é a prática comum do perdão, é a prática
diária da libertação do pecado contra nós em que passamos de
vítimas a culpados e posteriormente a perdoados. É o maravilhoso e
paradoxo mundo da fé em Jesus Cristo, com a intervenção direta do
Espírito Santo e a graça misericordiosa de Deus.
Alexandre Reis