ORIGENS E FÉ

Cada época tem os seus temas de discussão preferidos, baseados nos conhecimentos e nos interesses da altura. Na atualidade não somos diferentes.
Na época atual um tema muito popular de alguns anos para cá é a questão das origens.

Este tema que aparentemente parece inócuo é muito mais do que meras discussões cientificas ou debates em tertúlias ou cafés. A questão das origens inconscientemente molda a natureza humana e a perceção que se tem de toda a complexidade que rodeia cada pessoa.

As origens podem ser teorizadas, mas o certo é que já cá estamos, já existimos embora se possa divergir conceptualmente sobre como cá chegámos. Todas as teorias têm em comum o presente. Já em relação ao destino não há nada em comum, pois ainda não se chegou lá.
De onde vem a humanidade e para onde vai, origem e destino, são as convicções da incerteza, num universo onde as teorias são certezas absolutas e as discussões não acrescentam nada à rotina diária, mas inconscientemente moldam a atitude perante a vida e naturalmente como se vive a mesma.

A maneira de viver expressa aquilo que se acredita e o que se acredita é expresso através da fé, ou seja, a expressão externa da fé é o modus vivendi.

O conceito de origem do mundo e consequentemente da vida, não molda a globalidade do conceito do que é viver e do que é felicidade, pois no presente, a vida e a felicidade não têm apenas a marca dos inícios mas também é moldada pela sombra de um destino desconhecido.

O conceito do que é o universo ou a vida é algo intrínseco. Uns acham-se muito instruídos sobre o assunto, outros nem sabem que têm uma opinião acerca do tema.
Cada ser humano tem uma noção do que é o universo ou a vida. Pode não saber exprimir ou até verbalizar o conceito, mas no íntimo todos acreditam em alguma coisa.

No que concerne às origens, num extremo temos o conceito de eternidade, em que não há principio nem fim, em que a vida foi é e será sempre existente nas suas mais diversas formas físicas e espirituais.
No outro extremo, bem mais recente, temos o conceito de energia em que a origem está numa concentração energética que explodindo provocou a expansão e o aparecimento da vida e de tudo o que existe e que num futuro longínquo implodirá, convergindo tudo à origem energética.

O dilema existencial pessoal é influenciado pela mundividência da origem e do destino, marcando o presente que é vivido entre o que vê e o que sente. A expressão emocional da existência determina a maneira de viver e de considerar a vida.

A mundividência pessoal pode variar ao longo da vida, seja por influência social, busca espiritual, perceção de estudo académico, ou qualquer outra influência.

A mundividência ou cosmovisão pessoal forma a fé. Aquilo que se acredita é a prática diária da fé.

A fé não é um exclusivo das religiões, a fé é o que se acredita, seja consciente ou inconscientemente.

A cosmovisão pessoal inconscientemente forma o nosso ser e é expressa através da prática diária. O nosso dia a dia, a maneira livre da nossa vivência diária expressa aquilo que verdadeiramente acreditamos. A maneira como se gasta o dinheiro, a maneira como se gasta o tempo, a maneira como se valoriza os bens materiais, a maneira como se valoriza os bens sociais, a maneira que se lida com a dor ou com o infortúnio, o interesse nos relacionamentos interpessoais são expressões externas da mundovisão pessoal, quer seja consciente ou sem a perceção do que se está a fazer.

Somos aquilo que vivemos e não aquilo que dizemos ser ou que acreditamos que somos.

Ser qualquer coisa implica ter-se a cosmovisão dessa crença, seja ela política, filosófica, cientifica, religiosa, desportiva ou qualquer outra. Como cada coisa tem a sua cosmovisão chegando-se ao limite de se querer ser mais de alguma coisa e cada uma delas com diferentes visões da interpretação daquilo que nos rodeia. A filosofia de vida ocidental da atual época aceita esta contradição de se ser duas coisas diferentes e por vezes até contraditórias e não considera isso um problema.
A vida com plurivisões da realidade faz parte da aceitação social. Pode-se defender e acreditar numa coisa e no seu contrário ao mesmo tempo e isso não choca nem entra em conflito com a sociedade.
As consequências deste estilo de vida de algumas sociedades está a causar problemas sociais pessoais devido à falta de referências necessárias para a estabilidade emocional das populações.

A questão é que esta invasão sub-repticiamente está a entrar nas comunidades ditas cristãs e a alterar comportamentos e a sincretizar os ensinamentos bíblicos para os adaptar à agenda e aos interesses dos manipuladores e dos oportunistas para tirarem proveitos pessoais ou para introduzir práticas anti-bíblicas mas com uma roupagem agradável para ser aceite pelo seu público.
O mais caricato é que esta prática não é nova, no Novo Testamento algumas das epístolas são precisamente sobre as falsas doutrinas que se iam propagando dentro de algumas comunidades cristãs.

A vida diária reflete a fé, não se é um “bom cristão” ao domingo ou nas reuniões da igreja e um cidadão comum o resto do tempo. Muitas comunidades cristãs criaram os cristãos camaleões, onde o estilo vida varia consoante o grupo em que se está presente, adaptando-se assim à filosofia de vida de ser tudo consoante os interesses.

É incompatível um estilo de vida baseado numa cosmovisão limitada temporalmente e a cosmovisão cristã baseada na intemporalidade.

Fazer uma vida baseada em princípios de se ser “feliz”
de se sentir “realizado”
de se ser “reconhecido”
do “meu espaço”
do “meu sucesso”
é entrar numa espiral de egoísmo e da busca autosatisfação.

A demanda da felicidade pessoal é a pedra filosofal de alguma sociedade contemporânea, por isso a imagem de marca é a insatisfação constante, com todos os problemas psicológicos e existenciais que isso acarreta.

A sociedade foi formatada a procurar e não a usufruir, sendo incapaz a viver com o objetivo se o alcançar. Se a insatisfação é salutar na busca do conhecimento, causa problemas noutras áreas onde a estabilidade deveria ser a regra.

A demanda da felicidade, do sucesso, da procura dos bens materiais não é compatível com com a fé cristã. A vida cristã baseia-se no viver com, e não, no viver para.
Vive-se com o dinheiro e não para o dinheiro, vive-se com a a sociedade e não para o estatuto social., vive com as coisas e não para as mesmas.
O conceito de felicidade cristã nada tem a ver com o que a sociedade mundana tem para oferecer, embora algumas comunidades cristãs já tenham sincretizado essa filosofia de vida.

É uma pura perda de tempo e um ato hipócrita os cristãos quererem impor a sua fé e a vivência da sua fé a outros.
Em primeiro lugar porque a vivência da fé cristã tem nuances aplicáveis à vida diária que somente pela fé se consegue pôr em prática.
Em segundo lugar, muitos que se dizem cristãos a sua vida e o seu estilo de vida não se encaixam nos pressupostos da fé que dizem processar.
Em terceiro lugar a fé cristã é algo de livre escolha e não pode ser imposta.

Fé é a capacidade de se viver aquilo que se verbaliza e não é preciso muito para se aperceber as contradições de quem faz da religião um jogo mental para auto-satisfação e aprovação social

Fé é a competência para desempenhar idoneamente a vida cristã.

Jesus Cristo, além dos ensinamentos trouxe a mensagem que a vida é a expressão do que se acredita. A vida e obra de Jesus Cristo, que é a expressão viva de Deus, mostrou que a fé e a vida têm de se relacionar harmoniosamente, assim como a fé deve ser expressa em obras a vida deve refletir o fruto do espírito.

Assim como o coração de uma pessoa saudável fisicamente bate naturalmente, a fé é a capacidade de levar a vida a produzir o fruto do espírito com a mesma naturalidade que o coração faz o sangue circular no corpo.

A questão das origens estrutura a mente para o que se acredita, Jesus Cristo com a sua vida e os seus ensinamentos mostrou-nos que com a mente disponível para a infinitude do universo criado por Deus altera completamente a vida de quem nasceu física e intelectualmente limitado pela finitude deste mundo. Essa alteração passa pela reestruturação mental do conceito das origens da finitude do princípio e fim num ciclo único de vida, para o conceito de criação e de eternidade onde se conjuga o equilíbrio e a beleza de um universo infinito.

O princípio da infinitude de Deus liberta da procura insaciável por algo inatingível de quem vive com a mente e vida formatada para uma existência limitada por um conceito de origem finita que oprime a natureza eterna da existência.
O princípio da infinitude de Deus, que Jesus Cristo trouxe, liberta da demanda da auto-felicidade e abre a vida para usufruto da própria felicidade.


Alexandre Reis
Para algum esclarecimento contactar através do mail: blog.terradosreis@gmail.com

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